Palacete Rocco |
Em 1 de março de 1873, nascia a Sociedade Carnavalesca Esmeralda Porto-Alegrense, primeira agremiação de Porto Alegre criada a fim de celebrar o deus Momo.
Apresentando desfiles de carros alegóricos pelas principais ruas da cidade e bailes exclusivos a seus associados, tinha como objetivo acabar com o antigo jogo do entrudo e mudar os costumes carnavalescos em Porto Alegre.
A fim de comemorar essa data, e os 50 anos de sua fundação, em 1923 a agremiação organizou um imponente baile: o Jubileu da Esmeralda!
Celebrado no dia 07 de abril, nos salões do palacete Rocco, o grande baile comemorativo, abria "com chave de ouro" a série de festas com que a direção recém eleita iniciava sua gestão social. Era ela: Octávio Barreto, presidente; João Pompilho de Almeira, vice-presidente; Antônio Carlos Hartlieb Lima, 1° secretário; Lucídio Obino, 2° secretário; Mario Cahen Fischer, tesoureiro; Alberto Hartlieb, adjunto de tesoureiro e para a comissão administrativa, Afonso Beck, J. Oswaldo Rentzsch, Antônio José Esteves Barbosa, João Pereira da Costa e Jacinto Ferrari (A Federação, Porto Alegre, 19 de fevereiro de 1923, p. 4; A Federação, Porto Alegre,17 de março de 1923, p.4).
De acordo com o jornal A Federação (Porto Alegre, 10 de abril de 1923, p.2):
"Resplandecente de vida, de graça, de elegância e de animação foi o grande baile realizado sábado nos salões do palacete Rocco. Era de prever, pela brilhante tradição social da Esmeralda, o sucesso daquela festa. Tudo concorreu para o seu brilhantismo, desde a bela e riquíssima ornamentação e iluminação do salão até a grande seleta concorrência que se entregou animadamente às danças até 4 horas da manhã seguinte" (A Federação, 10 de abril de 1923, p.2).
Localizado na esquina das ruas Riachuelo e Dr. Flores, no centro da cidade, o palacete Rocco foi construído por Nicolau Rocco, italiano radicado em Porto Alegre. O prédio incluía uma fábrica de doces (no subsolo), confeitaria (no térreo) e salão de festas (no segundo pavimento). O terceiro pavimento era destinado para copa e salas de apoio (BRUM, 2009). Ponto de encontro da elite porto-alegrense, o palacete recebeu diversos bailes carnavalescos, sobretudo, da Esmeralda, da qual Nicolau era sócio. Descrevendo a fachada do prédio, bem como a ornamentação de seu interior para o baile, o jornal A Federação destacava que:
O palacete Rocco apresentava um aspecto verdadeiramente deslumbrante, a frente do edifício toda tomada por uma infinidade de lâmpadas multicores, na sacada central lia-se o seguinte, formado por pequenas lâmpadas verdes e brancas: Salve! 1873-1923 - Esmeralda.
A escadaria, os degraus e corrimões iluminados e ornamentados com guirlandas e vistosas palmeiras, no salão o aspecto era encantador, o trono de s.m. a rainha que estava armado em uma das faces do salão, também apresentava um aspecto belíssimo. A ornamentação e iluminação foram dirigidas pelo grande amigo da Esmeralda, sr. Nestor Mindello (A Federação, 10 de abril de 1923, p.2).
Agraciada por outras agremiações, a Esmeralda recebeu uma corbélia de flores do Club Caixeiral, "da qual pendiam entrelaçadas as cores das duas sociedades e um cartão com expressiva dedicatória". Além disso, uma comissão da co-irmã Filhos do Inferno, que tinha à sua frente o seu presidente o sr. Domingos Failace, também "prestou uma significativa homenagem à Esmeralda, a qual consistiu da oferta de uma riquíssima medalha de ouro, que foi pelo presidente dos Filhos do Inferno, colocada no estandarte da Esmeralda e à soberana foi entregue um bonito buquê".
Embora tenha surgido em 1873, ao findar daquela centúria, a agremiação enfrentou uma grave crise que a fez suspender os seus festejos. Em 01 de março de 1906, contudo, o jornal A Federação anunciava que “acaba[va] de reaparecer a antiga sociedade carnavalesca Esmeralda que há anos com tanto brilhantismo se fez representar nas festas do carnaval” (A Federação, Porto Alegre, 01 de março de 1906). Reunidos na saleta dos fundos da Predileta, na tarde da quarta-feira de cinzas após o período carnavalesco, um grupo de antigos sócios, teria formado o bloco da resistência e promovido o reerguimento esmeraldino.
ALEA JACTA EST!... (a sorte está lançada), assim anunciava a Esmeralda o seu retorno aos palcos do carnaval de Porto Alegre!
Há de se destacar que nessa nova fase as mulheres tiveram um papel de destaque, especialmente, as rainhas da sociedade. Comparadas à Nossa Senhora, à Virgem Maria, elas eram exaltadas por sua graça e beleza, bem como pelo recato e candura. A elas também eram direcionados uma série de festividades: bailes, tea-concerts, exposições de seus retratos, entre outras (LEAL, 2013). E no jubileu da Esmeralda não haveria de ser diferente. À rainha da agremiação, Isabel Bina Machado, também foram feitas diversas homenagens:
O sr. Napoleão Gonçalves, velho e ardoroso esmeraldino, saudou a rainha, entregando-lhe um belíssimo buquê, que foi oferecido pelo sócio honorário da Esmeralda, major Nicolau Rocco. [...]O sr. Jacinto Ferrari também ofereceu a senhorinha Isabel Bina Machado um lindo buquê (A Federação, Porto Alegre,10 de abril de 1923, p.2).
Jacinto Ferrari, além de sócio da Esmeralda, foi um importante fotógrafo, responsável pela documentação de boa parte da cidade. Junto a seu irmão, Carlos, tinha um estúdio, Ferrari &Irmãos, na Rua Duque de Caxias, 473, onde retratou muitas rainhas do carnaval de Porto Alegre. Além deles, o dr. Mário Totta, presidente do Club Jocotó, também entregou à soberana esmeraldina um riquíssimo buquê, tendo pendente as cores das duas sociedades e um cartão no qual se lia o seguinte:
A rainhaResplandescente e angelical lindezaQue a tua fronte cândida engrinaldaMais se exalça de graça e de belezaSob a régia coroa da Esmeralda
Ainda no ano do renascimento (1906), foi lançado um concurso musical a fim de compor um hino para a sociedade. O escolhido seria executado em todas as suas festividades, sendo o hino oficial da Esmeralda. O vencedor foi o do maestro Calderon de La Barca. Professor no Conservatório de Música do Instituto Livre de Belas-Artes, ele era membro do Centro Musical Porto-Alegrense e autor de diversos livros: o Tratado Enciclopédico Musical (1907), Apontamentos da história da música (1919), Compêndio de Teoria Musical (1922) (SIMÕES, 2011). Assim, ao som do hino composto por La Barca, entre entusiastas aclamações e alas de diretoras que a cobriram de pétalas de rosas, às 22:30, acompanhada pelo presidente da sociedade sr. Octávio Barreto, a soberana Isabel Bina Machado fez sua entrada no salão. Segundo o jornal A Federação:
Foi o momento mais lindo da festa, a gentil soberana da Esmeralda, pelo braço do presidente, encaminhou-se para o elegante solio que lhe fora preparado [...]. A seguir o orador oficial, dr. Alberto de Britto, fez uso da palavra, proferindo um brilhante discurso, saudando a nova soberana e também referia-se sobre a passagem do jubileu.
Após discursos, aplausos e homenagens foi dado o sinal para a polanaise. Muito difundida nas festas de carnaval, a polanaise, de origem polonesa, foi introduzida na corte francesa do século XVII. No Rio Grande do Sul, nas regiões de colonização alemã e italiana, até hoje continua sendo a dança solene de abertura de bailes. No baile da Esmeralda, cerca de 200 pares dançaram a polanaise.
[...] marcada pelo senador João Vespúcio de Abreu que tinha como seu par a soberana da Esmeralda, em seguida vinha a soberana dos Filhos do Inferno, pelo braço do presidente honorário da Esmeralda, sr. Afonso Beck, e as ex-soberanas sra. d. Elvira Fonseca Araújo, Julinha Barbosa Friederichs e Alba Pinto Ribeiro, que tinham como pares os membros da diretoria, srs. Hartelieb Lima, Mario Fischer e Oswaldo Rentzsch, respectivamente, secretario, tesoureiro e membro do conselho administrativo.
Depois da polanaise, foi a vez do One Step. Dança de salão muito popular no início do século XX, era caracterizada pela simplicidade na execução que privilegiava os passos andantes e pequenos saltos. E, assim, estava aberto o salão, sob a condução orquestra do maestro Leandro, composta de 20 professores, durando o baile de jubileu da Esmeralda até às 4 horas da manhã.
Embora já houvesse deixado de exibir seu tradicional préstito pelas ruas da cidade desde a década anterior, a Esmeralda ainda seguiria fazendo muitos bailes a fim de festejar o carnaval em Porto Alegre, encerrando suas atividade somente em 1941.
Referências
BRUM, Rosemary Fritsch.Uma cidade que se conta: narrativas de imigrantes italianos no espaço social da cidade de Porto Alegre -1920-1936. UFMA, Maranhão, 2009.
LEAL, Caroline. Festas carnavalescas da elite de Porto Alegre: Evas e Marias nas redes do poder (1906-1914). Tese (Doutorado em História), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.
SIMÕES, Julia da Rosa. Ser músico e viver da música no Brasil: um estudo da trajetória do Centro Musical Porto-Alegrense (1920-1933). Dissertação (Mestrado em História), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.