O Livro de Atas da Esmeralda


No post de hoje, apresentamos o livro de Atas da Sociedade Carnavalesca Esmeralda. Documento que visa registrar as decisões tomadas em assembleias ou reuniões, as atas descrevem de forma clara e objetiva os assuntos tratados pelo grupo que se reuniu e, enquanto fonte histórica, nos dão acesso às escolhas dos sujeitos que a produziram e a conjuntura histórica de então. Esse exemplar faz parte do acervo do Instituto Histórico Geográfico do Rio Grande do Sul.

Criada em 01 de março de 1873, a Esmeralda foi a precursora de um novo modelo de carnaval em Porto Alegre. Celebrando o reinado de Momo através de desfiles de carros alegóricos, com luxuosas fantasias, e bailes exclusivos aos seus associados, ela desapareceu no final do século XIX; porém, foi reerguida em 1906 e voltou a ganhar as ruas da cidade no carnaval de 1907, quando então organizaram o presente documento.

Constituído por 139 páginas, o livro apresenta 63 atas de reuniões, realizadas entre os anos de 1907 e 1926. Na primeira página, o documento traz o selo da Livraria Globo, local em que, provavelmente, foi adquirido o livro, seguido pelo primeiro registro: uma reunião realizada em 23/02/1907, quando da eleição da diretoria que substituíra "o grupo de Esmeraldinos que, sob a designação de bloco, sucedeu a diretoria aclamada em março do ano passada para a realização do carnaval de 1907" (Esmeralda, 1907).

Livro de Atas da S. C. Esmeralda

No ano anterior (1906), Artur Pinto de Souza Neves, Vilhena Machado e Tito Barbosa, sentados à mesa, na Confeitaria Central, tomavam seu chá das cinco e conversavam a respeito do “aparecimento de novas associações, como os Progressistas, Netos do Diabo, Pierrots", relembrando "os carnavais de passadas eras, esplendor luxuoso dos Venezianos e da Esmeralda...” (A Federação, Porto Alegre, 08/02/1907, p.2). Aparentemente, foi assim que esses esmeraldinos das antigas teriam fomentado a criação de um bloco a fim de trabalhar em prol do reerguimento da Esmeralda. A partir disso,  na quarta-feira de cinzas do carnaval daquele ano, o grupo teria se reunido no escritório da loja Predileta (de propriedade de Vilhena Machado) e proclamado a nova diretoria: presidente, tenente-coronel Frutuoso Fontoura; 1º vice-presidente, tenente-coronel José Ferreira Porto; 2º vice-presidente, comendador Cunha Guimarães; 1º secretário, capitão Benjamim Flores; 2º secretário, capitão João Pompílio de Almeida; tesoureiro, Trajano Mostardeiro; adjunto, Pedro Leão. Como o capitão João Pompílio não teria aceito o cargo de 2º secretário, para substituí-lo foi aclamado o diretor Aristóteles Sant’Anna Barbosa (O Independente, Porto Alegre, 04/03/1906; A Federação, Porto Alegre, 02/03/ 1911 e  24/02/1914). Contudo, a referida diretoria não teria levado os trabalhos adiante, como nos leva a crer o primeiro registro do livro de atas, sendo sucedido pelo grupo que ficaria conhecido como o bloco da resistência da Esmeralda.

Deliberando a respeito de assuntos como eleição de diretoria, organização do carnaval, modelo de distintivo, as reuniões também tratavam sobre o ingresso e aclamação de novos sócios, como foi o caso dos "artistas Fernando Schlatter, Frederico Zabel e Jacinto Ferrari pelos relevantes serviços prestados à Esmeralda com dedicação pessoal digna de nota e interesse artístico tão assinalado" (Esmeralda, 1909). Destacados profissionais do mundo das artes, eles foram responsáveis pela cenografia e fotografia da agremiação, trabalhando na criação dos desfiles e dos carros alegóricos e, dessa forma, angariaram o reconhecimento e aceitação dos demais sócios. 

É interessante destacar que na reunião do dia 30 de março de 1910, foi estabelecido um estatuto a ser adotado pela agremiação. No que tange aos requisitos para associar-se à Esmeralda, é possível verificar seu propósito de ser uma associação que reunisse o “escol da sociedade elegante de Porto Alegre”. No Capítulo I, o artigo I afirmava que “só haverá uma classe de sócios, composta por pessoas de qualquer nacionalidade, idade e sexo que contribuírem com a mensalidade de 2 mil réis e reunirem as qualidades precisas de moralidade e posição social [...]” (Esmeralda, 1910). Para ser sócio da Esmeralda, portanto, não bastava ser detentor de uma capital econômico que lhe permitisse efetuar o pagamento das contribuições de 24$ anuais, a serem pagas trimestralmente (O Independente, Porto Alegre, 04/03/1906). Era preciso ser um indivíduo que possuísse outros capitais (cultural, social, simbólico), externando signos de reconhecida distinção social, como os artistas mencionados anteriormente.

Fachada atual do prédio da antiga Livraria do Globo. 

A última reunião registrada no livro de Atas ocorreu em treze de setembro de 1926, numa das salas da Livraria do Globo (imagem acima), onde se tratou a respeito do projeto de ornamentação do "Baile das Flores" e a nomeação de comissões de diretoras, de recepção, de salão para o referido evento. Nesse ano, a Esmeralda organizou uma série de festas e reuniões para seus associados a fim de que "a veterena agremiação mantenha integrais o seu luzimento, o seu esplendor, constituindo, mesmo fora do período carnavalesco, um centro de arte e de bom gosto, de alegria e de rumor, como a realização de festas mensais, ao menos" (A Federação, Porto Alegre, 18/03/1906, p.2). 

Embora não haja mais registros de reuniões no documento aqui analisado, a Esmeralda perdurou até 1941, sendo uma das mais longevas associações carnavalescas de Porto Alegre. 

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