Carnaval em Porto Alegre: mulheres, entrudo, perseguição e repressão

Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar o ressurgimento da brincadeira do entrudo no carnaval da capital da Província do Rio Grande, a partir da década de setenta do século XIX. Se fará uma breve exposição do que era o entrudo, como este chegou ao Brasil e a Porto Alegre e como era brincado. Abordaremos o renascer do jogo (levado a cabo pelas mãos de uma mulher) e as séries de polêmicas que isto promoveu no seio da sociedade e da imprensa porto-alegrense: desde os limites da brincadeira, os motivos pelos quais ele era condenado, especialmente os que eram relacionados às mulheres, até questões de cunho político, social e de costumes.
Palavras-chave: carnaval; entrudo; repressão; imprensa; mulheres.

Abrstract: This article aims to analyze the resurgence of the entrudo in the carnival of the capital of the Rio Grande’s Province from the seventy decade of the nineteenth century. We will make a brief presentation of what was the entrudo, as this came to Brazil and Porto Alegre and as it was played.We speak about renaissance of the game (carried out by the hands of a woman) and the series of controversies that promoted within society and the press of Porto Alegre: from the limits of the game, the grounds on which he was convicted, particularly those which were related to women, to political, social and customs issues.
Key-words: carnival; entrudo; repression; press; women.



Para um espectador dos dias de hoje, habituado aos desfiles de escolas de samba e aos abadás no carnaval, pode parecer estranho ouvir falar de entrudo. Todavia, o entrudo era um costume bastante ligado às práticas carnavalescas desde os primórdios do Cristianismo. Segundo Baroja, o carnaval – ou Carnal – era uma época que se opunha à Quaresma e na qual era permitido comer carne. E o Antruejo – companheiro do termo português para entrudo – fazia parte deste conjunto de fenômenos que “só tem sentido como catarse preparatória para justificar a entrada na quaresma”[1]. A alegria e os excessos cometidos durante o carnaval e o entrudo seriam uma inversão da ordem , uma preparação para o momento de privação que estava por chegar[2]. Contudo, suas origens são ainda mais remotas e – para alguns autores – remetem às Saturnálias e Matronálias do Paganismo. Bakhtin, por exemplo, ressalta que é nítido que as tradições remanescentes das Saturnais “permaneceram vivas no carnaval da Idade Média, que representou com maior plenitude e pureza do que outras festas da mesma época, a idéia de renovação universal”[3]. Mas, afinal, o que eram as Saturnais? Estas eram “festas romanas em honra a Saturno que se realizavam em fins de dezembro e durante as quais se trocavam votos e presentes e se concedia aos escravos maior liberdade. Festas nas quais predomina a licenciosidade, orgia”[4]. Para Suetônio, há cerca de dois mil anos, o carnaval é um período “onde tudo é permitido, onde a transgressão se instala, embora fugaz e com hora para terminar”[5].

Seja de origem Cristã ou remetendo aos tempos do Paganismo, o carnaval – e o entrudo – torna-se uma tradição por toda a Europa, sendo que, na Península Ibérica, “ao contrário dos luxuosos bailes de máscara do resto da Europa, o Carnaval da Idade Moderna é caracterizado pelas corridas desordenadas em que as pessoas atiram umas nas outras, água suja, ovos, fezes, farina e outras substâncias”[6].

É interessante observar a visão do cronista Júlio Dantas, que escreveu a este respeito no início do século XX. Para ele, “nós, portugueses, nunca compreendemos que o entrudo pudesse ser uma festa d’arte como na Itália da renascença, ou uma festa d’espírito como na França de Luis XIX [sic]. O nosso entrudo foi sempre, desde o século XVII, fundamental e caracterizadamente porco. E mais: boçal, imundo, desordeiro e criminoso” [7].

Também para Valença, o carnaval em Portugal

não se caracterizou pelo refinamento dos bailes de máscaras, como franceses e italianos. Desde o século XVII, os portugueses brincavam nas ruas de Lisboa um carnaval diferente. Correndo desordenadamente de um lado para o outro, atirando ovos crus, líquidos de toda espécie, farinha e substâncias menos limpas nos transeuntes, os lisboetas e habitantes da cidade do Porto participavam de um tipo de carnaval característico da Península Ibérica e que daí passou para as Américas portuguesa e espanhola, popularizando-se entre nós[8].

Vejamos, ainda, a definição de Eduardo de Faria, no Novo dicionário de língua portuguesa, de 1861, a respeito do jogo:

Entrudo, s. m. (intróito de quaresma) os três dias que precedem a quaresma ou quadragésima, durante os quais é uso em alguns países divertir-se o povo banqueteando-se, molhando-se uns aos outros, empoando-se e fazendo outras peças jocosas; carnaval. Dia de entrudo, a terça-feira que precede à quarta-feira de cinza, primeiro dia da quaresma. Jogar o entrudo, entrudar. Passar o entrudo, botar o entrudo fora, divertir-se, banquetear-se; comer lautamente carne antes da quaresma. Ter o entrudo fora com alguém, divertir-se com essa pessoa por ocasião do entrudo. O nosso entrudo corresponde e é uma imitação das Saturnais da antiga Roma[9].

            Contudo, as práticas do entrudo abarcavam uma diversidade muito maior de diversões e de jogos, pois “esses festejos variavam de região para região e em cada cidade se apresentavam como uma reunião das brincadeiras típicas do lugar. Muitas dessas diversões possuíam características agressivas, possivelmente herdadas dos charivaris medievais, durante os quais certos grupos de pessoas criticavam as atitudes que desviavam da norma social através de zombarias e pancadarias simbólicas”[10].

Entretanto, com as críticas de parte daqueles que queriam a extinção desta brincadeira, considerada bárbara e pouco educada, e sua substituição por práticas carnavalescas mais sofisticadas – como as praticadas na França ou na Itália – os dias de entrudo deixaram de ser considerados como “um momento do ano que abrangia todo tipo de comemoração e passam a ser vistos como um jogo com regras e formatos específicos. Um jogo que resumia tudo aquilo que deveria ser extinto para dar lugar ao novo e civilizado carnaval nos moldes parisienses” [11].

A despeito de todas as críticas que sofreria, o entrudo foi a forma como o carnaval chegou ao Brasil e de acordo com Germano, “trazido pelos portugueses, desde a época da colonização foi uma das festas contidas no calendário cristão”[12]. Nestas brincadeiras, “não havia música, nem dança, mas muita bebida e correrias, perseguições, sujeira e violência”[13]. Flores, em um artigo sobre a história do carnaval em nosso país, afirma que “o entrudo era uma verdadeira batalha para molhar alguém com água jogada de balde, bacia ou seringa, com arremesso de limão de cheiro”[14]. Nestes dias, “homens e mulheres se empenhavam em loucas correrias e agarramentos, jogando água. Era um salve-se quem puder!”[15].

Segundo Cunha, durante muito tempo, entrudo significava “o mesmo que Carnaval: um conjunto de brincadeiras e folguedos realizados quarenta dias antes da Páscoa” [16]. Entre elas, além da molhadeira, argumenta a autora, compreendia-se uma série de troças de mascarados, bem como a pregação de peça em conhecidos ou passantes: “dias de molhadeiras, mas também dias de mentira e das pilherias que podiam, por vezes dar margem a incidentes desagradáveis se realizados fora de seu contexto específico”[17]. Havia também, o costume das mulheres de prepararem “empadas ocas ou recheadas com insetos para servir aos incautos, ou biscoito e pão-de-ló temperados com boas doses de vermífugos ou purgantes”[18]. Nesse jogo, todos brincavam: “homens austeros, estudantes, mulheres de postura recatada, crianças, escravos, trabalhadores livres. O grande apelo da festa era participar. Não havia graça em preparar armadilhas e engodos sem se arriscar a ser uma possível vítima a qualquer instante”[19].

1. O Entrudo em Porto Alegre

Na cidade de Porto Alegre, as comemorações carnavalescas – festejadas na forma do entrudo – parecem ter feito parte das vivências do povoado desde o início de sua formação[20]. Porto Alegre começou a ser ocupada ainda na primeira metade do século XVII, mas seu processo de povoamento só teria início com a chegada de casais açorianos em 1752. O pacato vilarejo passou a ser a sede da administração do governo provincial no ano de 1773, antes mesmo de ser elevado à categoria de município: isso só ocorreria por volta do início do século XIX, quando contava com uma população de 3.927 habitantes[21]. Segundo Damasceno, jogava-se o entrudo na cidade desde os “primeiros anos da colonização” [22].

Entretanto, diferentemente de outras regiões nas quais o entrudo abrangia uma gama mais variada de troças e brincadeiras, em Porto Alegre o que encontramos foi predominantemente “uma brincadeira na qual os foliões atiravam entre si os limões de cheiro, água das seringas e até farinha”[23], onde os passantes eram, muitas vezes “pegos de surpresa e obrigados a resignar-se com as roupas molhadas ou sujas pelos brincalhões”[24]. O objetivo era mesmo molhar e sujar o adversário.

Em 1847, todavia, através do Código de Posturas Municipais, a brincadeira foi proibida, tendo sido estipuladas multas para quem desobedecesse[25]. Segundo Weber, esses códigos, formulados pelas autoridades locais, é que “regularão o dia-a dia da população. Estes eram um conjunto de normas que estabeleciam regras de comportamento e convívio para uma determinada comunidade, demonstrando a preocupação com a preservação da ordem e a segurança pública, incluindo aí as relativas á saúde pública”[26]. Monteiro também afirma que “antes dos planos de urbanização, [os Códigos de Posturas] eram importantes instrumentos de controle político do meio urbano”[27]. Apesar da tentativa das autoridades em tentar deter o jogo, ele continuava existindo e foi somente partir da segunda metade do século XIX, por causa do medo das epidemias de cólera, que sua popularidade baixou. Segundo Weber, em meados do século XIX,

Porto Alegre sofreu ameaças de epidemias, fazendo parte das cidades atingidas no Brasil, em 1855, pela cólera. Essas ameaças foram constantes na década de 1850, destacando-se de febre escarlatina em 1850 e 1853, provavelmente em conseqüência do cerco da cidade na década de 1840, do aumento da população, devido a presença de tropas durante a Revolução Farroupilha, e do comércio com a área colonial, que não foram acompanhadas, imediatamente, de condições urbanas ideais para enfrentar uma maior concentração populacional[28].

Em decorrência destas epidemias – cólera, tifo e tísica – e das proibições e multas estabelecidas pelos Códigos de Posturas Municipais, a popularidade do entrudo decaiu, acarretando um relativo desaparecimento desta brincadeira, para a o deleite de seus críticos.

2. O Entrudo e as Mulheres

Após um período de aproximadamente 20 anos no qual houve um refluxo das práticas entrudescas na capital do estado, a partir de 1870 ocorreu um renascimento da brincadeira. Com isso, os periódicos da capital passaram a condenar de forma veemente o retorno deste jogo e a defender a implantação de uma nova forma de se brincar o carnaval, mais sofisticada e moderna, que trouxesse a Porto Alegre o requinte dos carnavais da Corte e de Veneza.

Entre os argumento mais utilizados pela imprensa porto-alegrense para condenar as práticas do entrudo estava o que atribuía ao jogo um caráter de ameaça à saúde pública, utilizando as recentes epidemias ocorridas na capital como forma de amedrontar os foliões e dissuadí-los de entrudar. O tifo, a tísica, e a febre eram lembrados com o intuito de abolir definitivamente essa prática dos costumes da cidade. Note-se que Porto Alegre, em fins do século XIX, vai passar por uma higienização, tanto física quanto moral, pretendendo estabelecer novos padrões de conduta e de sociabilidade naquele fim de século. Além da higienização física, que visava estabelecer em Porto Alegre ares de uma metrópole, pretendia-se “moralizar” a sociedade porto-alegrense, sobretudo as mulheres (que, como veremos adiante, passam a ser criticadas pela licenciosidade do entrudo).

Deste modo, o apelo a essas doenças tinha também um caráter moralizador e regulamentador do comportamento feminino. O jornal A Reforma argumentava que:

Ainda menos conveniente se pode dizer que é este jogo para as damas, pois não se dão bem com água fria, e mais de uma donzela robusta e viçosa tem deixado de ver o carnaval seguinte por haver sido arrebatada pela tísica, provocadas pelas águas aromáticas do limão[29].

O argumento sanitário é reforçado pela alegada fragilidade feminina. Segundo o jornal, o jogo do entrudo seria ainda mais inconveniente para as mulheres, que estariam mais suscetíveis às doenças devido à sua maior vulnerabilidade – em função da qual “não se davam bem com água fria”. Ademais, atribui-se uma excessiva fragilidade às damas e donzelas que seriam vítimas fáceis de tais males. O fato desta recomendação dirigir-se às mulheres se deve a que estas eram, normalmente, acusadas de serem as grandes entusiastas do jogo do entrudo, como veremos mais adiante. Não seria, portanto, “digno das humanas filhas do Rio Grande, num tempo em que o tifo, a febre e a tísica dizimam a população, ensopar d’água os que transitam nas ruas banhados em suor?”[30].

Weber pontua que “os discursos sobre higiene nesse período fundamentavam uma determinada concepção das relações sociais, definiam um procedimento de ordenação das mesmas que combinava saúde física com moral, sendo esta a dimensão da noção de progresso”[31], e é isso o que vemos no carnaval: a tentativa de controle e ordenação das práticas carnavalescas através de um discurso sanitário, incutindo no imaginário social[32] a noção de que esse era uma brincadeira rude e atrasada.

No que concerne a esta transformação física da cidade, observa-se que, “a partir da segundo metade do século XIX, a cidade recebe uma série de melhoramentos significativos”,[33] como, por exemplo, a construção do Teatro São Pedro (1858), da Hidráulica Porto-Alegrense (1865), do Mercado Público (1865), a implantação da primeira linha férrea ligando Porto Alegre a Novo Hamburgo (1876), a instalação de transportes coletivos (bondes) (1874), a regularização da coleta de lixo (1876), o início do saneamento (1878), a implantação de serviços telefônicos (1886), demonstrando, como afirma Simanski, o quanto a “expansão econômica se refletiu no desenvolvimento urbano da capital”[34].

Esse boom econômico ocorreu após um momento de crise e estagnação, quando a produção tritícola entra em decadência e o charque, produzido no sul da Província, passa a ter destaque, gerando um ofuscamento da cidade, “que ficou reduzida, do ponto de vista econômico, ao papel da capital regional de uma zona secundária”[35]. Essa estagnação econômica “se prolonga quase que até o último quartel do século passado”[36], mas, aos poucos a cidade readquire a função comercial que detinha anteriormente, tornando-se o escoadouro da produção das colônias alemãs e desenvolvendo-se rapidamente[37].

Entretanto, é por volta de 1890 que “inicia-se uma nova fase do fenômeno urbano, caracterizada pela crescente complexidade da organização dos grupos sociais no espaço urbano decorrente das transformações das estruturas política, social e econômica da sociedade brasileira”[38]. A cidade passa a ter dificuldades com o excesso de população, que de 18.465 habitantes, em 1858, salta para 43.998 no ano de 1872[39], com um aumento populacional que significou um crescimento de 138,27%. No centro, por exemplo, se percebe “... uma promiscuidade indesejada de ricos e pobres, vivendo face a face”[40].

Cláudia Mauch, ao pesquisar dois jornais porto-alegrenses (Gazeta da Tarde e Gazetinha) do final do século XIX, afirma que com grande freqüência, os termos desordem e imoralidade, apareciam em suas páginas. Segundo ela,

Para esses jornais, não eram considerados perigosos apenas as meretrizes, gatunos, vadios e desordeiros, mas todos os habitantes das zonas mais pobres da capital que não se enquadravam no modelo de ‘bom trabalhador’ e que viviam em ambientes física e moralmente degenerados, constituindo então a ‘escória’ ou a ‘parte ruim da sociedade’. A periculosidade dessas pessoas foi construída a partir da identificação da sua aparência  física, do seu comportamento desregrado, do seu tipo de trabalho e local de moradia[41].

Segundo esses jornais da capital, “a polícia deveria impedir que a ‘parte ruim’ da sociedade contagiasse a ‘parte sã’, proibindo a circulação de turbulentos e prostitutas em locais freqüentados por famílias [...]”[42]. Em suas campanhas de saneamento moral, ambos jornais acabavam generalizando “os adjetivos de desordeiros e imorais para todos os habitantes de zonas pobres de Porto Alegre. Pode-se dizer que lá onde existia diversidade e um modo de vida diferente do das elites, os jornais enxergavam o espaço das ‘classes perigosas’” [43]. Podemos sugerir, portanto, que a condenação do entrudo e a tentativa de estabelecer um novo modelo de carnaval - produzido pelas as elites - tenham sido, também, alguns dos primeiros passos nessa tentativa de saneamento físico e moral da cidade de Porto Alegre. Uma estratégia encontrada pelas elites no sentido de não mais precisar encarar os pobres, como por ocasião do entrudo, passando a exibir-se em elegantes desfiles e bailes fechados.

Mas de que maneira o entrudo teria ressurgido? De que forma ele teria conseguido escapar do esquecimento e voltar a usufruir a popularidade dos porto-alegrenses? A imprensa da capital havia atribuído este ressurgimento a uma mulher do alto escalão da sociedade, que ao jogá-lo reintroduzira a brincadeira na cidade. Segundo o jornal A Reforma:
Alguns anos havia que este jogo bárbaro caíra em desuso, quando a célebre ex-marquesa de Monte Alegre, mulher do atual Sátrapa de São Paulo, que já foi desta Satrapia do Rio Grande, o pôs novamente em moda. Que esta renovação do passado fosse obra da ex-marquesa nada há que admirar, pois é muito conhecida pelo seu ardente temperamento e extraordinário calor;
Não é, porém digno das humanas filhas do Rio Grande, num tempo em que o tifo, a febre e a tísica dizimam a população, ensopar d’água os que transitam nas ruas banhados em suor?[44]

Esse excerto permite-nos perceber não só o descontentamento por parte do jornal com o retorno do velho costume, mas também o ataque à conduta e moral da ex-marquesa, de quem tal comportamento podia-se esperar por causa de “seu ardente temperamento e extraordinário calor”. Ademais, note-se que, como ressaltamos anteriormente, o periódico ressaltava os riscos de contrair doenças como tifo e tísica a fim de alertar para as desvantagens destas práticas.

A ex-marquesa de Monte Alegre[45], mulher do ex-presidente da Província, Antônio da Costa Pinto e Silva[46], era uma mulher vinda de fora, de São Paulo, logo com um comportamento que não era, para o jornal, condizente com o das filhas do Rio Grande. Essas deveriam ser moças recatadas, elegantes e sofisticadas, não se deixando levar por esse bárbaro jogo e sem seguir o exemplo da ex-marquesa. Denota-se também aí, a intenção, por parte do periódico, em “apresentar a volta do vício como trazido de fora”[47].

Além de criticar o retorno do entrudo e o comportamento da ex-marquesa, a análise do excerto permite observar uma referência a termos que denotam uma certa erudição[48] por parte do colunista, que compara o marido da ex-marquesa com os Sátrapas da Antiguidade, apontando para outros elementos significativos para a cidade e, por conseguinte, para esse trabalho. Segundo Lazzari, o jornal A Reforma, vinculado ao Partido Liberal, chamava o ex-presidente provincial de Sátrapa – governadores das províncias do Império Persa – com o intuito de designar o governo como despótico e centralizador, como se aqueles também representassem um governo assim. Isso porque o Imperador, desde 1868, “mantinha o Partido Conservador no controle dos Ministérios e dos governos provinciais, tendo os governadores nomeados sofrido intensa oposição dos liberais gaúchos”[49]. O fato de o colunista ter utilizado um termo do mundo antigo pôde despertar nosso interesse sobre uma possível relação entre os papéis femininos atribuídos às atenienses do século V a.C. e às porto-alegrenses do século XIX durante os festejos carnavalescos, considerando o que Perrot e Duby denominavam “continuidades fundamentais do viver histórico”[50].

Na Grécia Antiga, o termo hetairai era utilizado para designar as mulheres que acompanhavam os homens no espaço público. Segundo Ullmann, “eram mulheres de alguma cultura e não raras provindas do estrangeiro. Participavam em pé de igualdade nas conversações com os homens que eventualmente se valiam delas para satisfação sexual”[51]. Essas mulheres podiam participar dos simpósios[52], festividades das quais as mulheres casadas não podiam. Enquanto esposas, se restringiam apenas ao espaço do gineceu.

Por esse motivo, enxergamos na ex-marquesa um comportamento condizente ao de uma hetera, pois essa, vinda de fora, entrudou e o fez no espaço público, participando em pé de igualdade com os homens da festividade. A ex-marquesa, contudo, era uma mulher casada, diferenciando-se das heteras atenienses, apesar de ter sido atacada pelo articulista no que se refere à sua atitude de liberdade de agir, de forma semelhante aos homens, rompendo com os lugares a ela destinados.

Do mesmo modo, no Rio de Janeiro, décadas mais tarde, encontramos articulistas denominando mulheres da alta sociedade de heteras, por causa de seus comportamentos durantes os festejos de Momo, o que vem corroborar nossa comparação:

(...) muitas são as damas finas que se nivelam às hetairas nos clubes, nos bailes, nos três dias de orgia carnavalesca (...) Terminada a festa, porém, as prostitutas continuam no seu ‘triste’ mister; as elegantes, ‘decaídas eventuais’, tornam aos seus lares, tomam parte em ligas contra o álcool, veitam o ‘verbo’ fulminando vícios[53].

Essa citação demonstra que, provavelmente, não estávamos equivocados ao comparar aqueles dois universos femininos, pois eles estavam presentes na forma de ver o mundo dos homens de jornais daqueles tempos, tanto é que utilizavam em uma época termos análogos a outra. Além disso, o fato de o jornalista ter denominado a mulher do Presidente da Província de Ex-Marquesa, nos transmite a noção que ele estava tentando atacá-la moralmente por ter participado da brincadeira, pois ele não a chamou pelo nome ou por adjetivos que se reportassem a sua condição de “primeira dama” do Rio Grande do Sul, mas sim evidenciou que um dia fora marquesa e hoje não era mais, tendo se casado novamente com o então Presidente da Província.

Diferentemente das heteras, as esposas atenienses abastadas e bem-nascidas tinham um padrão a seguir, o modelo mélissa. Isso consistia em permanecer reclusa no interior de sua casa, cuidando dos filhos e dos bens da família. Especializavam-se em tecer, bordar e fiar. Deveriam ter um “tipo de vida puro e casto, ou seja vida sexual bastante discreta; hostilidade aos odores, à sedução; a fidelidade conjugal”[54]. Fábio de Souza Lessa, entretanto, contesta essa idéia de que a atuação feminina fora do oikos era algo exclusivo das heteras e dos homens. Para ele há uma permeabilidade mútua entre os espaços, exterior/interior.

Maria Angélica de Souza afirma que “as esposas abastadas utilizavam táticas com o intuito de diluir as margens desse modelo e assim subvertiam a dominação masculina alcançando dessa forma certa autonomia”[55]. A autora completa ainda que as “esposas abastadas atenienses do período clássico transgrediam ao modelo idealizado pela sociedade ateniense não o rompendo por completo”[56] mas criando um lugar social para elas.

Na obra Oréstia, Ésquilo apresenta a personagem Clitemnestra como uma transgressora do modelo melissa. Clitemenestra, que era esposa de Agamêmnon, como vingança, se uniu a um primo dele e o assassinou, para reinar em Micenas; depois disso, ainda teria abandonado os filhos. Segundo Severina Ramos dessa maneira o autor

apresenta e discute as falhas do pretenso ‘modelo ideal’ de comportamento feminino, mostrando de maneira oposta do pretendido a postura das mulheres dentro desta sociedade, levando-nos a crer que a confirmação de mulheres alheias ao processo político, econômico, religioso e social estava longe de ser presenciado no cotidiano [57].

Nesse sentido, é que Lessa argüi que se deve fazer uma distinção entre ideais culturais e práticas sociais. O confinamento das esposas no gineceu é, portanto, “mais um ideal cultural de seus maridos do que propriamente uma prática”[58].

Passamos, por conseguinte, a visualizar o comportamento da a ex-marquesa não mais como o de uma hetera, mas sim como o de uma esposa bem-nascida, uma mélissa que rompeu com essas fronteiras interior/exterior, transgredindo os ideais culturais destinados às mulheres do Rio Grande.

Dessa forma, a critica feita à prática do entrudo e a tentativa de se estabelecer um novo tipo de carnaval correspondem a uma imposição de certos modelos culturais relacionados ao comportamento feminino, condenando a licenciosidade que caracterizaria esta brincadeira e afirmando não ser esta uma conduta adequada às boas damas porto-alegrenses. Contudo, estes ideais culturais acabavam sendo contrariados pelas práticas sociais dos agentes uma vez que, pelo menos algumas mulheres (como no caso a ex-marquesa), não se submetiam a estes ideais e continuavam a entrudar[59].

Mas qual o porquê de se fazer essa comparação? Atenienses e porto-alegrenses, tempos e espaços a principio tão longínquos e distintos? Duby e Perrot ao refletirem sobre a história das mulheres e das relações entre os sexos, se perguntam: “quais foram, em suma, as continuidades fundamentais, as descontinuidades maiores e os acontecimentos decisivos?”[60]. Para nós, essa é uma das continuidades fundamentais: mulheres peculiares que têm comportamentos diferenciados daqueles que lhes são apregoados. A existência dessa fração feminina, encontrada tanto em Atenas, quanto em Porto Alegre, em tempos diferentes, é histórica. Mas além dessas “transgressoras”, histórico também é o fato de se querer enquadrar as mulheres em papéis, ou nos ideais culturais de que nos falava Lessa.

Como antecipamos anteriormente, as recomendações contra o jogo do entrudo produzidas pela imprensa costumavam dirigir-se, sobretudo, ao público feminino devido à alegada predileção que as mulheres cultivavam por tais folguedos. Assim, as mocinhas de família, ou das boas famílias, tinham como um dos “prazeres diletos” entrudar. Esta predileção feminina pelo entrudo foi constatada pelo viajante John Luccock, que sentira na pele este entusiasmo. Segundo ele:

O seu pretendido entrudo estritamente familiar e doméstico era algo próximo de uma ficção. Os mais antigos relatos mostram que, muito embora ocorressem batalhas de limões de cheiro entre famílias amigas, ficar de tocaia nas janelas e ensopar passantes distraídos era um dos prazeres prediletos das donzelas da terra, ainda mais se as vítimas fossem estrangeiro[61].

            O relato do viajante vem corroborar a idéia apresentada de comparação do carnaval de Porto Alegre à Grécia Antiga. Ele nos mostra que as donzelas da terra participavam da brincadeira sim, mas com a proteção do lar, atrás de suas janelas, no espaço do gineceu. Analisando o carnaval carioca, Ferreira salienta que “a maioria das famílias de posses continuava a se entregar às delícias do entrudo familiar – fato que pode ser constatado pela manutenção da venda de limões de cheiro nas ruas da cidade, anunciada nos jornais”[62]. Em Porto Alegre, este entrudo familiar também era bastante apreciado, mesmo entre as elites mesmo que Luccock afirmasse que este era uma ficção. Embora ocorressem casos em que transeuntes eram vítimas das molhadelas, suas algozes contavam nestas ocasiões com a proteção doméstica, de seus lares.

Nesse mesmo sentido, vemos o relato de um antigo morador de Porto Alegre sobre o carnaval na cidade:

Quem se quisesse transportar ao antigo entrudo de Porto Alegre havia de lembrar-se que na rua Nova, em casa das Ângela e Perpétuas, havia nas três tardes de entrudo um perfeito bazar de banheiras, gamelas, bacias, alguidares, seringas, copos, canecas e canjirões, a não deixar impunes os transeuntes; que no Alto da Bronze além de tudo isso ainda havia o vermelhão, o polvilho e os pós de sapatos; e que a moçada de Porto Alegre saía a pé ou a cavalo com a competente cestinha de limões de cheiro ao braço, acompanhados de criados com os respectivos suplementos, a molharem aqui e acolá as descuidadas (ou não descuidadas) que se achavam às janelas. (...).[63]

Percebe-se que as moças de família participavam e gostavam da brincadeira, tanto é que ficavam em suas janelas à espera de rapazes para jogá-la. O entrudo familiar, doméstico, ao que tudo indica, era aprovado pelos habitantes da Província, sendo o problema jogar o entrudo em público, não respeitando as regras da boa convivência.

Arséne Isabelle, viajante francês que aqui esteve entre 1833 e 1834, revela, segundo Careli, em seu relato, “a tirania e a severidade que não permitia a estranhos, como ele próprio, a aproximação dessas mulheres e ao fato das mesmas serem condenadas a permanecerem em casa, longe dos olhos alheios, ousando apenas observar furtivamente o movimento da rua ‘entricheiradas’ nos parapeitos ou sacadas de suas residência”[64], não sendo esse um comportamento só em dias comuns, como também durante a brincadeira do entrudo, como vimos.

A partir disso, podemos entender um pouco melhor a polêmica causada pela ex-marquesa, durante os festejos momescos: as filhas do Rio Grande, igualmente, participavam da brincadeira, mas com a proteção do lar, das janelas, dentro de casa; a ex-marquesa, por sua vez, se apropriou de um espaço público para participar da festa. DaMatta, em um estudo para tentar entender a sociedade através de seus espaços, os quais ele divide em casa, rua e outro mundo, afirma que “o espaço se confunde com a própria ordem social, de modo que, sem entender a sociedade com suas redes de relações sociais e valores , não se pode interpretar como o espaço é concebido”[65]. Segundo o autor, “o normal – o esperado e o legitimado – é que casa, rua e outro mundo demarquem fortemente mudanças de atitudes, gestos, roupas, assuntos, papéis sociais e quadro de avaliação da existência em todos os membros de nossa sociedade” [66]. Dessa forma, a casa é por ele entendida como uma área especial, um “espaço infenso ao tempo linear, onde as coisas ‘lá de fora’, do ‘mundo’ e da rua não atingem, com seus novos valores de individualização e subversão, a velha e boa ordem estabelecida pelas diferenças de sexo, idade e ‘sangue’”[67]. Já a rua “é o local de indesejável individualização, de luta e de malandragem”[68], é uma “terra que pertence ao ‘governo’ ou ao ‘povo’ e que está sempre repleta de fluidez e movimento”[69].

Não sabemos se a ex-marquesa foi de fato às ruas da cidade brincar o entrudo; entretanto, mesmo que ela o tenha feito somente no Palácio, sendo esse uma área pública, pode-se dizer que ela se apropriou de um espaço associado à rua, por serem ambos, palácio e rua, distintos da casa. De acordo com DaMatta, esta tem como linguagem a subversão da ordem[70], enquanto a da casa – que é onde as moças da terra brincavam – seria a da moral[71]. Apesar de estarem entrudando, as filhas do Rio Grande estavam protegidas, pois estavam no reduto familiar, onde a ordem já estava estabelecida. A ex-marquesa, além de fazer retornar o costume, o fez no espaço da rua, que é o lugar da subversão, tornando–se então uma transgressora dos modelos de conduta destinados às mulheres e da própria ordem social.

Mas teria a atitude daquela melissa influenciado as filhas da província? O que se sabe é que, na década de 1870, as pessoas voltaram a se entregar à prática do entrudo e que isso rendeu muita polêmica entre jogadores, policiais, fiscais, jornalistas, etc.

Do mesmo modo que observamos a participação das boas moças de família nos jogos de entrudo familiar, na proteção de seus lares; há ainda referências a mulheres “não bem nascidas” que também entrudavam. Assim, em um processo resultante de agressões presumivelmente sofridas por uma mulher de nome Maria Antônia, chegamos a um universo no qual as práticas entrudescas mostravam-se presentes entre as camadas populares. Neste processo, o pardo Jorge – um escravo de Dona Thereza Emília de Lima com 32 anos de idade que exercia o ofício de alfaiate – fora acusado de ter agredido a Maria Antonia – uma meretriz de 29 anos que residia no famoso Beco do Fanha – tendo-lhe causado alguns ferimentos no rosto.

Entretanto, contrariando a versão policial, em seu depoimento, Maria Antônia afirmou que havia saído para ir “à casa de uma moça sua conhecida a fim de jogar o entrudo”[72]. Quando voltava, foi atingida por limões de cheiro, que a fizeram cair e por isso teria se ferido, “batendo com o rosto em uma laje que fica do lado de dentro” [73] de casa. O pardo Jorge – que aparecera em sua residência “por ocasião de principiar com o jogo do entrudo”[74] – “nenhum mal lhe fez”[75], tendo-a somente repreendido em função de sua queda.

Na versão do alferes Guimarães, que deu voz de prisão ao acusado, este foi preso quando “lutava com uma mulher, dando-lhe pancadas, achando-se a mesma toda ensangüentada e ele próprio com a camisa toda rasgada” e esta pediu que o referido alferes não o prendesse “porque ele fazia tudo aquilo por amizade”[76].

Para Burke, o uso de histórias narradas pelas pessoas no passado, registradas nos arquivos de polícia, permite que o historiador tenha acesso a diversas vozes do passado e diferentes visões do mesmo assunto. Entretanto, ele recomenda que,

 a questão para os historiadores nesse tipo de justaposição de narrativas concorrentes é não tentar decidir a história de quem é a ‘correta’ (como faria o juiz) ou provar o que tomamos como realidade é uma ilusão (como faria um filósofo), mas usar as histórias para reconstruir as atitudes e valores dos narradores, empregando um conflito de narrativas para compor uma narrativa de conflitos.[77]

Provavelmente, os ferimentos não foram causados pela brincadeira, como afirmava Maria Antônia, mas o que nos interessa é o fato dela tê-la usado para justificá-los, podendo ser isso um indicativo de que esse jogo poderia, às vezes, ter uma face agressiva e grosseira, fazendo com que pessoas saíssem lesionadas da diversão.

Além disso, denota-se que outros segmentos sociais, como no caso o de uma prostituta, também entrudavam com todo gosto e utilizavam o espaço dito como correto pela imprensa para a brincadeira: o privado. E não somente isso: Maria Antônia, ao tomar esta postura, não rompeu com as fronteiras designadas para as participações femininas, e sim, adequou-se aos padrões estabelecidos como corretos. Careli, ao investigar inquéritos policiais, processos criminais e crônicas jornalísticas, buscando a caracterização da virtude, expõe “a forma como determinados comportamentos veiculados como ideais, característicos de um dado grupo social, não ficavam restritos ao mesmo, sendo de formas diversas incorporados por indivíduos alheios a ele”[78], como no caso de Maria Antônia, uma popular, que, ao brincar o entrudo, o fez na casa de uma amiga, no interior do lar, como recomendavam os jornalistas, e atribuiu a culpa de seus ferimentos ao entrudo público, que era também condenado pela imprensa.

3. Entrudo, Imprensa e Repressão

Com este ressurgimento do entrudo, percebe-se uma preocupação tanto da imprensa quanto das autoridades no sentido de tentar evitar a sua proliferação. O jornal A Reforma, externava sua preocupação com a situação ao afirmar que “em todas as ruas da capital se tem jogado entrudo como nos tempos antigos, e todo o arreganho policial não conseguiu mais do que fazer com que um ou outro agente policial tomasse banho involuntário”[79].

Em um tom irônico, o jornal narrava o retorno do entrudo como nos tempos antigos, satirizando a força policial que acabou, involuntariamente, entrando na brincadeira, o que deixava transparecer uma certa impotência das autoridades policiais em sua tarefa de repressão ao jogo. Paulo Moreira, ao analisar a questão do policiamento urbano em Porto Alegre, afirma que “os relatórios do período constantemente enumeravam a precariedade da força policial como uma das causas da criminalidade, mas concordavam que ‘avultada como já é a verba a ela destinada’, a Assembléia dificilmente atenderia as reclamações de diversos municípios, que pediam a criação de seções policiais”[80], enfatizando bem essa questão da ineficácia policial perante as transgressões, como o era considerado o entrudo.

Nesse ano, as autoridades pareciam querer cumprir com as posturas municipais referentes ao entrudo, tanto é que foram publicados editais, em sucessivas datas[81], relembrando sua proibição. Um desses editais, mandado publicar pela Secretaria de Polícia de Porto Alegre, informava que:

De ordem do Illm. Sr. Dr. Chefe de policia faço publico que, sendo proibido o jogo do entrudo e venda das respectivas laranjas pelos arts. 99 e 100 das posturas municipais, estão dadas as ordens precisas para serem multadas todas as pessoas que nele foram encontradas e na venda das ditas laranjas, que serão também inutilizadas. [82]

Era, portanto, proibido por lei jogar e vender utensílios para a prática do entrudo na cidade de Porto Alegre, tendo – quem o fizesse – que pagar multas por isso. Dessa forma, ao retornar o velho costume e as autoridades tentarem detê-lo, muitas disputas e discussões foram geradas. Percebe-se que havia um descompasso entre aquilo que era uma infração por lei e o que era considerado transgressão no imaginário social.

Numa dessas confusões, geradas por esse desafinamento, encontramos o jornal A Reforma publicando uma série de artigos nos quais provocava e revidava as notas do rival Riograndense, que era o jornal oficial, do Partido Conservador[83]. Um episódio em particular ganhou a atenção dos articulistas, quando um rapaz foi preso pelos fiscais, acusado de ter atirado suas laranjinhas. Pedro Nicolau da Silva Telles, tenente do exército, havia sido “intimado pelo fiscal Antônio Francisco de Paula para que não continuasse a jogar entrudo na rua”[84].

O jornal A Reforma assumindo francamente sua defesa, afirmou que sua prisão teria sido ilegal, um desacato policial.

Entre outros citamos o fato acontecido anteontem à noite na rua da Igreja, á porta de uma respeitável família, que dois fiscais e três policias acharam o lugar mais próprio para se darem em espetáculo, mostrando o seu arreganho bélico e uma educação digna de inveja!
Um moço d’essa família tinha ido jogar entrudo em casa de pessoas de seu conhecimento e os amáveis fiscais e os seus guardas entenderam que deviam cercar-lhe a morada e não só multá-lo, como ainda exigir a multa incontinente sem estrepito, nem figura de juízo!
O espetáculo, aliás, tão edificante, fez com que se reunisse muita gente, e foi preciso muita prudência da parte do ofendido, para que não levassem os agentes policiais a lição que mereciam.
O Sr. Chefe da Policia pode empregar as medidas que quiser – legais, para fazer cumprir a postura municipal, mas faça-o em termos e sobretudo caiba os seus agentes de excessos, como aquele que acabamos de apontar.[85]

A fala do jornalista nos deixa entrever a vulnerabilidade policial diante do entusiasmo das pessoas com o jogo. Os agentes, mesmo no cumprimento do seu dever, por pouco não acabaram sofrendo represália e agressões por parte do acusado, que segundo a nota, precisou de muito cuidado e sensatez para que não agredisse aos policiais.

Segundo o depoimento do acusado, em versão que entra em choque com o que disse o jornal, ele estava em frente à sua casa e admitiu que um de seus amigos portava limões de cheiro, mas que ele não estava a brincar e nem carregava nada e confessou ter dito apenas que não receberia ordens de paisanos[86]. Segundo Moreira, “os atritos entre policiais e soldados do Exército foi uma das preocupações mais freqüentes das autoridades provinciais, principalmente num período ainda caracterizado pela confusão de papéis a serem desempenhados por ambos os corpos, na manutenção da ordem pública”[87],  tanto que em 1878 o presidente da Província declarava que:

Fruto de antiga e talvez invencível rivalidade, que a severa disciplina do Exército mau continha, os conflitos entre a força pública e a de polícia vão tomando tal caráter, proporções tão extraordinárias e violentas, que reclamam do governo e dos chefes militares a mais séria atenção.[88]

A Reforma justificava que o problema teria sido causado pela postura das autoridades, criticando os atos do chefe de polícia que, sempre tão brando, tem se mostrado capaz de posturas violentas, como o do caso em questão, mesmo que essas tenham sido tomadas por seus subordinados. Apesar de ter feito cumprir a lei, publicando os editais de proibição do jogo, as autoridades teriam se equivocado ao quererem proibir o entrudo doméstico ao invés de se preocuparem com o público, que era o gerador de problemas.

O sr. Chefe da Polícia anda se querendo mostrar deveras rigoroso!
S. S. tão melífluo, tão elegante, nunca nos pareceu próprio para papeis terríveis; mas pelo que se vê, vai pondo os braços de fora, ao menos por seus agentes.
Mandou S.S. publicar um edital, fazendo constar a disposição da posturas municipais que proíbem o jogo, chamado de entrudo!
Até aí foi muito bem; era uma disposição legal, fê-la conhecida e devia torná-la obrigatória.
O que, porém, o Sr, Chefe da Polícia, não podia e nem pode proibir, é que as famílias no interior de suas casas, divirtam-se do modo que muito bem queiram.
Na porta do domicilio do cidadão cessa a jurisdição da autoridade, sempre que a ordem publica não seja alterada; mas n’esses casos extremos não depende a jurisdição de simples vontade.
O sr. Chefe da polícia com seus agentes não entendem a  coisa assim, e com tal furor, tão cegos se atiram aos jogadores do entrudo, que em lugar de proibirem que se lancem bacias d’água do alto das janelas e publicamente nas ruas, endireitam-se a querer multar os que, no uso do seu direito legítimo, jogam o entrudo com as famílias de sua amizade e no interior das casa![89]

O periódico era, portanto, contra a proibição de que as pessoas, dentro de casa, jogassem o entrudo. Condenava apenas aqueles que perturbavam a ordem pública, tal como os que lançavam bacias de água das janelas. O aumento populacional pode ter sido um dos fatores que justificava essa posição, pois o entrudo público, apesar de ser uma brincadeira feita por quem se conhecia e tinha certo grau de relacionamento, tornava-se um incômodo, um problema quando jogado entre estranhos e que não estavam dispostos a entrar na folia. O periódico A Reforma, a respeito da brincadeira no ano de 1873, anunciava que “não nos consta que se tivesse dado fato algum de gravidade, em que tivesse de intervir a polícia. Houve, porém, muita disputa, muita queixa, muita reclamação, de uns que queriam molhar, e de outros que não queriam ser molhados”[90].

Dessa forma, o que causaria danos e malefícios para a população e para a cidade, seria o jogo público, e esse sim é o que deveria ser coibido.

Julgamos pernicioso o entrudo especialmente o publico, do meio das ruas sem respeito às conveniências, à saúde dos transeuntes, e na maior parte das vezes brutal – pelo emprego das bacias d’água, tinta, etc; mas ninguém pode proibir que as famílias, que os cidadãos dentro de sua casa, com as pessoas de suas relações, esmaguem todas as laranjinhas presentes e futuras!
Mais respeito ao lar domestico, a que se deve recato e consideração!
Ah, Sr. chefe da policia, se fossemos moças havíamos de fazê-lo convidar a qualquer reunião a nossa casa e depois molhá-lo, bem molhadinho, para que abrandasse mais seu terrível arreganho!
E fique certo que então em pouco tempo, S. S. tão galanteador,  seria o mais terrível jogador de entrudo![91]

Deve-se atentar para o fato de o jornalista ter dito que se fosse mulher haveria de molhar o chefe da polícia para abrandar suas violentas ameaças e que, em virtude disso, ele se tornaria um feroz folião, passando a jogar entusiasticamente o entrudo e abandonando a rígida perseguição que fazia, mesmo contra aqueles que o fazem no aconchego de seus lares. Além disso, a expressão do jornalista deixa transparecer uma proibição subjetiva de que um homem pudesse molhar outro e que o jogo era realizado entre homens e mulheres. Não seria, portanto, de bom tom um homem molhar a outro[92].

O jornal A Reforma queixava-se de uma nota que teria sido publicada pelo periódico Riograndense[93] que afirmava ser falso o conteúdo da notícia publicada por ele. O jornal do Partido Liberal então se defendeu:

Por nossa vez declaramos que – falsa é a comunicação, porque se afastou inteiramente da verdade!
O que afiançamos foi o que se passou e podemos prová-lo com muitas testemunhas que nos referiram o fato.
Na ocasião em que os fiscais, acompanhados de seu cortejo de soldados, foram cometer o desacato a porta da casa da família do oficial, não se achava este jogando entrudo, estava recolhido e muito tranqüilamente conversando.[94]

Além de denotar as rivalidades existentes entre os jornais e a solidariedade destes com seus grupos de apoio – como, por exemplo, a aliança polícia/Riograndense – a nota demonstra o quanto a brincadeira mexia com a rotina e com o viver das pessoas na antiga Porto Alegre. Para nós, contudo, o mais interessante é a parte que se segue, quando o jornalista tenta esclarecer porque achou a prisão um desacato policial: quando os oficiais chegaram à casa dessa família, eram duas mulheres que estavam saindo para brincarem o entrudo na casa de amigas, e isto não seria crime, haja vista estarem elas no interior do domicílio.

A despeito disso, a brincadeira feita em casa parecia ser um costume bastante comum e, até mesmo tolerada, sobretudo se jogado pelas moças. Em contrapartida, o jornal que defende esse tipo de jogo recomenda maior rigor com a repressão do entrudo em público.

O que os fiscais podiam ter visto, foi o que dissemos ontem, isto é, que duas moças d’esse família tinham ido á casa vizinha molhar uma suas camaradas.
Isto não constituía infração de postura, porque passou-se fora do alcance das posturas, no interior do domicilio, e portanto os fiscais nada podiam fazer, o seu ato foi ilegal e atentatório.
A’ tarde, esse moço havia com muitos outros jogado e nas mesmas circunstancias já apontadas, mas a essa hora  os fiscais - nada fizeram – e, nem mesmo podiam fazer; guardaram-se para a ocasião em que só um indivíduo lhes pudesse cair nas garras, inda que para isso excedessem suas funções e cometessem uma grosseria – que nem nossas leis, nem nossos costumes podem admitir.
Esta é a narração fiel dos fatos![95]

É curioso perceber que, ao explicar que eram duas moças que iam brincar, o jornalista pareceu estar dizendo: ah! Eram duas moças a jogar o entrudo e isso não é crime, moças jogando o entrudo, tudo bem! Essa referência nos remete para o conceito de habitus proposto por Bourdieu. Para ele, o habitus “produz práticas e representações que estão disponíveis para a classificação, que são objetivamente diferenciadas”[96]. Neste sentido é que, a propósito de uma roupa, “de um móvel ou de um livro, nós dizemos: ‘Isso é coisa de pequeno burguês’, ou ‘Isso é coisa de intelectual’”. Assim, o entrudo – “isso é coisa de mulher” – também pode ser apreendido como um habitus feminino, que enquanto sistema de esquemas de classificação está objetivamente referido, através dos condicionamentos sociais que o produziram, a uma condição social”[97].

Além disso, o jornalista afirmava que o que estava sujeito a multas ou prisões seria a brincadeira pública e não aquela praticada no interior das residências. Apesar de as posturas não se referirem ao jogo público ou privado e apenas dizerem que ele era proibido, como vimos no edital, os articulistas do jornal A Reforma defendiam o entrudo doméstico e condenavam somente o praticado nas ruas.

Novamente, a idéia de uma certa vulnerabilidade por parte dos policiais é apresentada. Segundo o jornal, estes não foram cumprir seu dever quando todos estavam a jogar, mas sim quando já se achavam dispersos, efetuando a prisão de somente um. Além de questões pessoais que podiam estar em jogo, isso denota a fragilidade dos fiscais, que não poderiam controlar o enfurecer das massas, optando por fazer cumprir as posturas municipais quando estas já estavam espalhadas.

Podemos notar que a brincadeira era um momento em que questões do cotidiano da pequena Porto Alegre eram exacerbadas: disputas políticas, ideologias, modos de pensar, pois enquanto festa ela é o “reflexo duma civilização, símbolo, veículo de mitos e de lendas”,[98]como salienta Heers.

Confirmando sua postura de condenação ao jogo do entrudo no espaço público e de tolerância ao jogado em casa, o jornal A Reforma criticava a postura repressiva da polícia, sobretudo por considerar que o retorno desta brincadeira, em grande parte, devia-se às próprias autoridades locais que, no ano anterior haviam ignorado o Código de Posturas e brincado livremente, dando ao povo um exemplo a ser seguido, uma vez que a lei valeria para todos. Afirmava o jornal que:

Não somos apologistas dos brinquedos de entrudo pela antiga forma, mormente quando da casa passam para a rua e são executados com maneiras brutais; no caso vertente, porém não podemos deixar de dar razão ao povo, não por espírito “revolucionário” e de “anarquia”, mas sim por justiça e equidade.
Estavam adormecidos os jogos de entrudo; pálida e descorada festa só fazia com meia dúzia de mascaras; o povo não se divertia mais, porém também não brincava mais com água e limões de cheiro.
A lei havia triunfado de um velho e inveterado uso, que finalmente estava sendo esquecido.
No ano passado, porém, houve quem quisesse brincar de entrudo, e quem soubesse convencer o Sr. Coelho Bastos da completa “inocência” d’esse brinquedo e da necessidade e de abrogar de fato Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul o uma postura absurda.
Com tácito consentimento da policia (pois que o Sr. Coelho Bastos também brincou e não pouco), reviveu o entrudo.
Por essa ocasião, o então órgão dos liberais fez algumas observações sobre o escândalo dado pelas primeiras autoridades da província, que estavam mofando das posturas municipais, e o contemporâneo do “Riograndense”, que na ocasião ainda não fazia parte da polícia e gostava também de brincar, respondeu com molejos, aprovando o procedimento das autoridades, o que aliás era e é o seu oficio.[99]

Novamente, o jornalista retomava a presença da ex-marquesa na brincadeira, lembrando que fora ela que convencera o Chefe da Polícia da “completa ‘inocência’ d’esse brinquedo e da necessidade e de abrogar de fato uma postura absurda”. Além disso, o articulista do jornal, ao afirmar que a brincadeira estava adormecida, deixa saber que, na opinião dele, “o povo não se divertia mais” pois a “justiça triunfara”, informando o grau de popularidade do entrudo que encantava significativa parcela da população.

Já comentamos anteriormente o fato de A Reforma, sendo um jornal liberal, denominar o marido da ex-marquesa, então presidente da Província, de Sátrapa, numa crítica ao governo imperial. No Rio de Janeiro os jornais freqüentemente associavam o entrudo ao Império, fazendo duras críticas a eles. Note-se que tanto D. Pedro I, quanto seu filho D. Pedro II, parecem ter sido ardorosos jogadores[100] e, aos olhos de quem defendia o novo carnaval, o gosto dos monarcas por tal divertimento parecia “contribuir para que o entrudo, monarca destronado, persistisse comandando o Carnaval nas ruas”[101]. Assim, a tentativa de identificar o entrudo com o imperador indicava que “a monarquia já era vista, em pleno contexto do abolicionismo e da propaganda republicana, como algo tão arcaico quanto o velho entrudo, que se combatia em nome da civilização e do progresso”[102].Aqui, a imagem entrudo/império, a fim de criticá-los, era atrelada a uma mulher, nossa ex-marquesa, a quem foram atribuídas características que não deviam ser seguidas pelas “humanas filhas do Rio Grande”. Deslegitimavam não apenas o comportamento daquela mulher, como também a permanência do entrudo e do império, confirmando, como afirma Heers, que, “reflexo brilhante de civilizações e de culturas, a festa não pode ser olhada, em caso algum, independentemente do meio social e político em que decorre”[103].

Para o jornalista, entretanto, a proibição do jogo do entrudo só valia para a “arraia miúda”. Enquanto fora jogado em palácio, por pessoas da alta sociedade porto-alegrense, não era perseguido. Quando praticado fora destes círculos privilegiados da sociedade, rigor no caso. Assim, criticava-se que

Passa-se um ano e mudam as cenas: hoje já não se brinca de entrudo em palácio, e, portanto rigor no caso.
Aí vão ordens, editais, arreganhos policiais e palavras severas e moralizadoras do órgão policial; o Entrudo é proibido, não se deve brincar, porque d’esta vez não há Entrudo em palácio! O povo, porém, entendeu o caso de maneira diversa, e as moças, sobretudo, que às vezes dispõem de inexcedível lógica, disseram lá com os seus botões:
“Ora qual! Seu Coelho Bastos! V. S.a o ano passado brincou e deixou os mais brincarem; V. S.a e a roda palaciana de então foram os que fizeram reviver o Entrudo, já esquecido e sepultado; agora tenha paciência que nós não estamos pelos autos e queremos brincar, porque isto de lei é invariável e não é feita para os meros caprichos das autoridades!”
E zás! Um banho de cheiro no Sr. Chefe, um balde de água no sr, subdelegado, um fiscal submergindo n’um tanque...
E peguem-lhes com um trapo quente.
O povo também tem a sua lógica, e por isso entende que, se no ano passado o Sr. Chefe e a roda palaciana fizeram reviver o entrudo, não o podem proibir n’este ano, tanto mais quanto, o sr. Chefe da Polícia também gosta, e ainda proibindo o entrudo, joga mui honradamente o seu limãozinho de cheiro...[104]

A Reforma apresenta as moças – possivelmente influenciadas pela postura da ex-marquesa – como as principais autoras, as líderes da reivindicação para que se jogasse o entrudo naquele ano. A postura dos palacianos – que jogaram alegremente entrudo no ano anterior sem nenhuma punição – poderia ter influenciado o povo, que, desacatando as autoridades, voltara a jogar entusiasticamente. Agnes Heller afirma que um dos fatores gerais que estruturam os papéis sociais é a imitação. Para ela, o “homem é capaz de imitar não apenas momentos e funções isoladas, mas inteiros modos de conduta e de ação”.[105] Talvez por esse motivo, a postura da ex-marquesa tenha tido tamanha repercussão e causado o retorno da brincadeira com tanta força, pois “mesmo a vida social mais elementar seria inimaginável sem imitação”[106].

Deste modo, mesmo que não consigamos encontrar referências diretas dos agentes sociais sobre a influência do comportamento da ex-marquesa sobre o retorno das práticas entrudescas, a nota do periódico A Reforma transcrita acima aponta para esta realidade: o entrudo jogado nos círculos palacianos despertara o jogo das ruas, do povo, e a postura condescendente da polícia – que no ano anterior teria inclusive participado da brincadeira – levara a uma quebra da autoridade. De que maneira o sr Coelho Bastos queria impedir o jogo de entrudo se o próprio havia se entregado a tais diversões?

O entrudo havia, então, regressado com toda força! Jogado por todos, brancos, negros, pobres, ricos, homens e mulheres, ainda seria alvo de muitas polêmicas, discussões e disputas na capital da Província do Rio Grande!

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NOTAS
[1]BAROJA, Júlio Caro. Le carnaval. Paris: Gallimard, 1979.  Apud: Reflexões sobre o carnaval na historiografia - algumas abordagens. Revista Tempo, Rio de Janeiro, v. 7, p. 169-188, 1999, p. 171.
[2]A tese de Baroja de que o carnaval seria uma busca pelo equilíbrio social na qual a sociedade se desloca de um extremo a outro é contestada pela historiografia. Ver SOHIET, Rachel. Reflexões sobre... Op. Cit., p.171.
[3] BAKHTIN, Mikhail Mikhailovitch. A cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de François Rabelais. HUCITEC; Brasília: Ed. da Universidade de Brasília, 1993, p.6.
[4] Larousse Cultural. Nova Cultural. 1999, p.5275.
[5] ALBIN, Ricardo Cravo. Uma apreciação sobre as origens do carnaval carioca, que constituíram o milagre das escolas de samba de hoje. Terceira Margem,Rio de Janeiro, número 14 ,p. 160-165, janeiro-junho / 2006, p. 160.
[6] KRAWCZYK, Flávio; GERMANO, Íris e POSSAMAI, Zita. Carnavais de Porto Alegre. Porto Alegre: Secretaria Municipal de Cultura, 1992, p.11.
[7] DANTAS, Júlio. Gazeta de Notícias, 21 de fevereiro de 1909. Apud. ALBIN, Ricardo Cravo. Uma apreciação sobre... Op. Cit., p.160.
[8]VALENÇA, Rachel. Carnaval: pra tudo se acabar na quarta-feira. Rio de Janeiro:Relume-Dumará: Prefeitura, 1996, p.10
[9]Faria, Eduardo de. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Eduardo & Henrique Laemmert. 1861. Apud. FLORES, Moacyr. Do entrudo ao carnaval. Estudos Ibero-Americanos, XXII (1) – junho, 1999, p.149.
[10]FERREIRA, Felipe. O triunfal passeio do “Congresso das Sumidades Carnavalescas” e a fundação do carnaval moderno no Brasil. Terceira Margem, Rio de Janeiro, Número 14 , p. 160-165 • janeiro-junho / 2006, p. 12.
[11]Ibid.,  p.12.
[12]GERMANO, Íris. O Carnaval no Brasil: da origem européia à festa nacional. C.M.H.L.B. Caravelle, n.173, Toulouse, 1999, p.132.
[13]VALENÇA, Rachel. Op. Cit., p.13.
[14]Ibid, p.152
[15]Ibid, p.152.
[16]CUNHA, Maria C. P. Ecos da Folia: uma história social do carnaval carioca entre 1880 e 1920. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, p.25.
[17]Ibid,p.56.
[18]Ibid, p.56.
[19]SOIHET, Rachel. A subversão pelo riso: estudos sobre o carnaval carioca da Belle Époque ao tempo de Vargas. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1998, p.66
[20]Cf. FRANCO, Sergio da Costa. Porto Alegre: Guia Histórico. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 1998, p.100.
[21]SIMANSKY, Luis Cláudio. Espaço privado e vida material em Porto Alegre no século XIX. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998, p.41.
[22]FERREIRA, Athos Damasceno. O Carnaval pôrto-alegrense no século XIX. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1970, p.11.
[23]KRAWCZYK, Flávio; GERMANO, Íris e POSSAMAI, Zita. Op. Cit., p.16.
[24]Ibid, p.16
[25]Livro de Registros de Posturas Municipais de 1829 a 1888.4 dez 1829.“Posturas Policiaes da Câmara Municipal da cidade de Porto Alegre aprovadas pelo Conselho Geral da Província”. Porto Alegre, Typ. Do Commercio, 1847 (anexadas ao Livro de Registros das Posturas Municipais de 1829 até 1888). AHPA.
[26]WEBER, Beatriz. Códigos de Posturas e Regulamentação do Convívio Social em Porto Alegre no Século XIX. Porto Alegre:UFRGS, Dissertação de Mestrado, 1992, p.8.
[27]MONTEIRO, Charles. Porto Alegre: urbanização e modernidade: a construção social do espaço urbano. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995, p.30.
[28]WEBER, Beatriz.. Op. Cit., p.98.
[29]A Reforma, 15 de fevereiro de 1871.Apud: FERREIRA, Athos Damasceno. Carnaval Porto-alegrense no século XIX. Porto Alegre: Globo, 1970,p. 18.
[30]A Reforma, 15 de fevereiro de 1871.Apud: FERREIRA, Athos Damasceno. Carnaval Porto-alegrense no século XIX. Porto Alegre: Globo, 1970, 19.
[31] WEBER, Beatriz. Op. Cit., p.108.
[32]Segundo Baczko, “os imaginários sociais constituem outros tantos pontos de referência no vasto sistema simbólico que qualquer coletividade produz e através da qual, como disse Mauss, ela se perscepciona, divide e elabora seus objetivos. [...] É assim que, através dos seus imaginários sociais uma coletividade designa sua identidade; elabora uma certa representação de si; estabelece a distribuição dos papéis e das posições sociais; exprime, impõe crenças comuns; constrói uma posição de ‘bom comportamento’, designadamente através da instalação de modelos formadores tais como o do ‘chefe’, o ‘bom súdito’, o guerreio corajoso’, etc.”´. BACZKO, Bronislaw. Utopia. In: Enciclopédia Einaudi (Antropos – homem). Portugal: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, s/d. Vol. 5, p. 309-310.
[33] MONTEIRO, Charles. Op. Cit.,  p. 31.
[34] SIMANSKY, Luis Cláudio. Op. Cit.,  p.52.
[35] SINGER, Paul. Desenvolvimento econômico e evolução urbana. São Paulo, Nacional, 1977, p. 153.
[36] Ibid, p.153.
[37] Cf. ARAND, Sílvia. Um olhar sobre a família popular porto-alegrense (1886-1906). Porto Alegre: UFRGS, Dissertação de Mestrado, 1994, p.22.
[38]SINGER, Paul. Op. Cit, p. 33.
[39]Anuário estatístico do Brasil 1936. Rio de Janeiro : IBGE, v.2, 1936.
[40]PESAVENTO, Sandra. Os Pobres da Cidade: vida e trabalho – 1880-1920. Porto Alegre: Edufrgs, 1994,
 p. 86.
[41]MAUCH, Cláudia. Saneamento moral em Porto Alegre na década de 1890. In: MAUCH [et. al.]. Porto Alegre na virada do século XIX: cultura e sociedade. Porto Alegre/Canoas/São Leopoldo: Ed. Universidade/UFRGS/Ed. ULBRA/ Ed. UNISINOS, 1994,9.
[42]Ibid, p.12.
[43]Ibid, p.14.
[44]A Reforma, 15 de fevereiro de 1871.Apud: FERREIRA, Athos Damasceno. Carnaval Porto-alegrense no século XIX. Porto Alegre: Globo, 1970, 19.
[45]Não conseguimos, até o momento, descobrir de fato o nome da ex-marquesa de Monte Alegre. Acreditamos ser ela Maria Isabel de Souza Alvim, a segunda esposa do, José da Costa Carvalho, com quem casou-se em São Paulo, em 1839. O Marquês de Monte Alegre morreu em 1860 e ela se casou novamente com Antonio da Costa Silva e Pinto. Site de genealogia, disponível em http://www.jbcultura.com.br/gde_fam/pafg109.htm. Acessado em 31 de março de 2007.
[46]Exerceu mandato de 16/09/1968 a 20/05/1869. Apud: AITA, Carmem (org.). Parlamentares Gaúchos das Cortes de Lisboa aos nossos dias: 1821-1996. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, 1996.
[47]LAZZARI, Alexandre. Certas coisas não são para que o povo as faça: Carnaval em Porto Alegre(1879-1915). Dissertação de Mestrado. IFCH/UNICAMP, Campinas, 1998, p. 65.
[48]Erudição entendida como sinônimo  de saber vasto e variado.
[49]LAZZARI, A. Op. Cit., p.65.
[50]PERROT, Michelle, DUBY, Georges. História das mulheres no Ocidente. Porto: Afrontamento,  1990, vol.1, p.14.
[51]ULLMANN, Reinholdo. Amor e Sexo na Grécia Antiga. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005, p.64.
[52]Reuniões para filosofar e beber em conjunto.
[53]Revista Policial, 26.02.1927. Apud: SOHIET, Rachel. A sensualidade em festa: representações do corpo feminino nas festas populares no Rio de Janeiro da virada dos séculos XIX a XX. Diálogos Latinoamericanos, n.002, Aarhus, 2000, p. 108.
[54]DETIENE, Marcel. O Mito Orfeu no Mel. In: LE GOFF, J. História: Novos Objetos. Rio de Janeiro:Francisco Alves, 1976, p. 55 e 56.
[55]SOUZA, Maria Angélica Rodrigues. Melissa: gerenciamento, complementaridade e transgressão na Atenas Clássica. In: Gaia – Revista Eletrônica de História Antiga, 2002, p.1. Disponível em http://www.ifcs.ufrj.br/~gaia/m%20m.htm, acessado em 27/05/2007.
[56] Ibid, p.1.
[57]RAMOS, Severina Oliveira. Teatro e o feminino na Atenas Clássica. In: Gaia – Revista Eletrônica de História Antiga, 2001, p.1. Disponível em  http://www.ifcs.ufrj.br/~gaia/m%20m.htm, acessado em 27/05/2007.
[58]LESSA, Fábio de Souza. Mulheres de Atenas. Melissa do Gineceu  à Agora. Rio de Janeiro: Laboratório de História Antiga/ IFCH da UFRJ, 2001, p.106.
[59]Gisele Becker, ao pesquisar narrativas literárias, inventários, processos de divórcio e jornais, aponta para a diversidade dos tipos femininos que circulavam em Porto Alegre. Havia “mulheres que se adequavam ao padrão desejado de retidão ( a boa esposa, a boa mãe, a defensora dos filhos, a mulher que se apega as coisas simples da vida e não ao prazeres mundanos e ao luxo, a moça de boa índole, a que suporta o adultério do cônjuge), mulheres que fogem a esse estereotipo ( a adúltera, a ciumenta, a questionadora, a viúva que contrai um segundo matrimonio, a mulher que assume os negócios deixados pelo marido, as que passam a administrar  propriedades, a que não perdoa a infidelidade do marido) e, até, possivelmente mulheres que conjugam diferentes elementos desses perfis.”
[59]BECKER, Gisele.Uma História Polifônica: Mulheres e Laços de Família em Porto Alegre (1858 -1908). Dissertação de mestrado, PUCRS, Porto Alegre, 2001, p. 274.
[60]PERROT, Michelle, DUBY, Georges. História das mulheres no Ocidente. Porto: Afrontamento,  1990, vol.1, p.14.
[61] Relato do viajante inglês John Luccok, de 1808, sobre o banho que tomou das filhas do Governador, reproduzido em FEERIRA, Athos. Op. cit. p. 10.
[62]FERREIRA, Felipe. Op. Cit., p. 12
[63]CORUJA, Antônio Álvares Pereira, Antigualhas: Reminiscências de Porto Alegre, Organizado por Sérgio da Costa Franco, 2a Ed. Porto Alegre: UE/Porto Alegre, 1996. O trecho citado faz parte de um artigo originalmente publicado em Gazeta de Porto Alegre, 13 de março de 1884.
[64]CARELI, Sandra.Texto e contexto: Virtude e Comportamento Sexual Adequado às Mulheres na Visão da Imprensa Porto-Alegrense da Segunda Metade do Século XIX.  Porto Alegre: Dissertação de Mestrado, UFRGS, 1997, p.10
[65]DAMATTA, Roberto. A Casa e a Rua. Rio de Janeiro: Guanabara, 1991, p. 34.
[66]Ibid, p.53.
[67]Ibid, p.59
[68]Ibid, p.61.
[69]Ibid, p.63.
[70]Ibid, p.55.
[71]Ibid, p.54.
[72]Secretaria de Polícia. Maço 67. 03 de fevereiro de 1872. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[73]Secretaria de Polícia. Maço 67. 03 de fevereiro de 1872. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[74]Secretaria de Polícia. Maço 67. 03 de fevereiro de 1872. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[75]Secretaria de Polícia. Maço 67. 03 de fevereiro de 1872. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[76]Secretaria de Polícia. Maço 67. 03 de fevereiro de 1872. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[77]BURKE, Peter. Desafios de uma história polifônica. Folha de São Paulo, São Paulo, 15 de outubro de 2000, Caderno Mais!, p.18
[78]CARELI, Sandra. Op. Cit., p. 278.
[79]FERREIRA, Athos. Op. Cit., p. 23.
[80]MOREIRA, PauloRoberto.  E a rua não é do rei. Morcegos e Populares no início do policiamento urbano em Porto Alegre - século XIX. In: Sobre a Rua e Outros Lugares. Reinventando Porto Alegre. Porto Alegre: Caixa Econômica Federal, 1995, p.59.
[81] Nos dias 24, 25, 26, 27 de fevereiro e 01 de março.
[82]Edital publicado pela Secretaria de polícia de Porto Alegre, pelo Secretário César Vianna, em 4 de fevereiro de 1870.  A Reforma, 24 de fevereiro de 1870, p.3.
[83] “Rescindi o contrato que tinha o Jornal do Commercio, desta capital para a publicação dos atos da Presidência, e mandei contratá-la com o Rio-grandense, por ser, alem daquele, o único jornal diário aqui existente. Os motivos que tive para assim proceder são os mesmos que fundamentam a exoneração de um dos chefes ostensivos de sua redação”. Relatório com que o Ex UFRGS,m. Sr. Dr. Israel Rodrigues Barcellos passou a administração ao Exm. Sr. Dr. Antonio da Costa Pinto Silva. 16 de setembro de 1868. AHPA.
[84]Auto de Perguntas feitas ao Tenente Pedro Nicolau da Silva Telles. Secretaria de Polícia, maço 67, 26.02.1870. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[85]A Reforma, 27 de fevereiro de 1870, p.3.
[86]Secretaria de Polícia, maço 67, 26.02.1870. Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul.
[87]MOREIRA, Paulo. Op. Cit., p.55.
[88]Relatório do Presidente da Província – A. 7.15 – AHRS. Apud: MOREIRA, Paulo. Op. Cit., p.71.
[89]A Reforma, 27 de fevereiro de 1870, p.3.
[90]A Reforma, 27 de fevereiro de 1873. Apud: LAZZARI, Alexandre. Op. Cit, p.20.
[91]A Reforma, 27 de fevereiro de 1870, p.3.
[92]Não encontramos referências sobre regras do jogo em relação ao gênero, se homens não poderiam molhar outros homens, somente mulheres. Em relação a elas há referência de mulheres brincando com mulheres. Sabe-se que escravos não podiam molhar seus senhores e sim brincar somente entre eles. Cf. FRANCO, Sergio. Op. Cit., p. 100.
[93]Não constam aqui as notas publicadas pelo Riograndense porque não estavam elas disponíveis para pesquisa.
[94]A Reforma, 02 de Março de 1870, p.3.
[95]A Reforma, 02 de Março de 1870, p.3.
[96]BOURDIEU, Pierre. Coisas ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004,  p.158. e 159
[97]Ibid, p. 159
[98]HEERS, Jacques. Festas de loucos e carnavais. Lisboa: Publ. D. Quixote, 1987, p.11.
[99]A Reforma, 01 de março de 1870, p.3. Para FERREIRA. Op. Cit., p.15e LAZZARI. Op . Cit.,p.54,  encontra-se no Jornal do Comércio, 1870.
[100]VALENÇA, Rachel. Op. Cit., p.14
[101]CUNHA, Maria. Op.Cit., p.54.
[102]Ibid., 54.
[103]HEERS, Jacques. Op. Cit.,  p.11.
[104]A Reforma, 01 de março de 1870, p.2.
[105]HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. Paz e Terra: São Paulo, 1970, p.88.
[106]Ibid, p.87.

Publicação original: LEAL, Caroline P. Carnaval em Porto Alegre: mulheres, entrudo, perseguição e repressão Antíteses, vol. 1, n. 1, jan.- jun. de 2008, pp. 209-235 http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/antiteses