Carnavalescas Diplomadas


Diploma de carnaval?!

Pois é! Os Venezianos, sociedade carnavalesca criada em 1873, após seu reerguimento no inicio do século XX, adotou a prática de entregar um diploma aos seus associados. Atestando o pertencimento da pessoa aos quadros da agremiação, o documento conferia autoridade e distinção a seu portador, ao lhe assegurar formalmente uma competência específica; no caso, a de fazer carnaval!

Ao analisar o documento, podemos perceber que as ilustrações faziam referência ao carnaval de Veneza, de quem a sociedade herdara o nome e o modelo de festa. No lado esquerdo, é possível verificar um pierrô (personagem da Commedia dell’Arte, típica do carnaval veneziano) observando uma espécie de máscara bauta, um pandeiro e uma insígnia que representava a sociedade carnavalesca, tendo como pano de fundo a cidade italiana, com suas gôndolas e arquitetura característica. A personagem carnavalesca também empunhava o estandarte veneziano, trabalhado em vermelho e branco, cores da agremiação.

Assinado pelo presidente, vice-presidente, tesoureiro, secretário e diretor-geral, observa-se que o diploma era destinado às mulheres que pertenciam ao seu quadro associativo, haja vista a flexão de gênero do substantivo sócio e a inscrição de “excelentíssima”. Entendido como representação simbólica nominada (Bourdieu; Boltanski, 1998; Bourdieu, 2007), o diploma é revestido de poder simbólico e ter o nome atrelado ao documento, como no caso das sócias venezianas, “[...] é sentir-se com o direito de exigir as coisas que, normalmente, estão associadas a tais palavras, isto é, às práticas […] e aos correspondentes benefícios materiais e simbólicos [...]” (Bourdieu; Boltanski, 1998, p. 129), como o de se fazer parte do carnaval, por exemplo.

É importante assinalar que, surgida como uma iniciativa masculina, da qual as mulheres não faziam parte, exceto como espectadoras, após seu reerguimento no início do século XX (1906), os Venezianos apresentaram algumas modificações no que tange à participação das mulheres no carnaval. Integrando as comissões organizadoras das festas, desfilando nos carros alegóricos ou recebendo o título de rainha da agremiação, elas passaram a ser enaltecidas por seu empenho e exaltada moralidade no carnaval. Além da ampliação dos espaços a serem ocupados, também se observa mudanças na representação das carnavalescas, que deixaram de ser as responsáveis pela contaminação dos festejos de Momo e pela falência da agremiação, por permaneceram afeitas às brincadeiras de entrudo, para simbolizarem a ressurreição do carnaval (Leal, 2013). 

Dessa forma, a fim de enaltecer sua participação na festa, às sócias venezianas eram concedidos diplomas que atestavam sua distinção, legitimando seu pertencimento aos quadros da agremiação e sua condição de sujeito carnavalesco.

Eram carnavalescas diplomadas!



Referências

BOURDIEU, Pierre; BOLTANSKI, Luc. O diploma e o cargo: relações entre o sistema de produção e o sistema de reprodução. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio (orgs.). Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, p.127-145, 1998.
BOURDIEU, Pierre. A Distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2007.
LEAL, Caroline P. Festas carnavalescas da elite de Porto Alegre: Evas e Marias nas redes do poder (1906-1914). 2013. Tese (Doutorado em História) - Programa de Pós-graduação em História, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.

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