“RIO GRANDE DO SUL, SEU FOLCLORE, SUA GENTE, TAMBÉM PARTICIPARAM DESSA FESTA DIFERENTE...”

Elis Regina na Mocidade: o canto que virou trem

O enredo da Mocidade de 1989 partia de uma metáfora poderosa: Elis como um trem que atravessa o Brasil com sua voz.

Em 1989, a Mocidade Independente de Padre Miguel decidiu prestar uma homenagem carregada de afeto: “Elis, um Trem Chamado Emoção”. O nome já entregava a proposta — levar para a Sapucaí a história e o legado de Elis Regina (1945 – 1982), a cantora nascida em Porto Alegre que conquistou o país com sua intensidade.

Lá pelas bandas de lá
No sul do meu país
Eternamente a cantar, Elis, Elis, Elis
(Paulinho Mocidade, Dico da Viola e Cadinho – 1989)




Lupicínio Rodrigues no Jacarezinho: Dor de cotovelo em tom maior

Em 1987, a Unidos do Jacarezinho fez um desfile que muita gente talvez tenha esquecido, mas que merece ser lembrado com carinho. O enredo era “Lupicínio Rodrigues, Dor-de-Cotovelo” — e o nome já dizia tudo.

O compositor gaúcho Lupicínio Rodrigues (1914 — 1974), nascido em Porto Alegre, foi homenageado com emoção e autenticidade em um desfile do Jacarezinho.

Mestre da dor de cotovelo, Lupi transformou o sofrimento amoroso em arte com músicas como “Nervos de Aço” e “Esses Moços”. A escola rosa e branco apostou em um carnaval sem luxo, mas cheio de alma: botequim, boemia, coração partido e violão. O samba enredo era melódico, quase uma seresta. Sem exageros, o desfile tocou quem assistiu. Foi simples, mas verdadeiro. E quando a verdade canta, a avenida escuta com o coração.

Entra meu amor fique à vontade
Para homenagear
O grande artista e poeta popular
Que se faz vestir de rosa e branco
É por aqui a vida e obra de Lupi
(Milton de Luna, Madeira, Benê do Feitiço, Lúcio Bacalhau e J. Andrade – 1987)


João Cândido: o Almirante Negro desfilando duas vezes

João Cândido (1880 – 1969), o “Almirante Negro”, símbolo da Revolta da Chibata, foi homenageado duas vezes no grupo especial.

A primeira, em 1985, pela União da Ilha do Governador, com o enredo “Um Herói, um Enredo, uma Canção”. A segunda, em 2024, pela Paraíso do Tuiuti, com “Glória ao Almirante Negro”.

A Ilha prestou uma homenagem ao herói da Revolta da Chibata e também um tributo à canção “Mestre Sala dos Mares”, de João Bosco e Aldir Blanc, que eternizou Cândido na memória popular. Aliás, ambos os compositores desfilaram com a tricolor insulana.

A interpretação ficou por conta de Quinho (1957 — 2024), em sua estreia como voz principal da escola. Elis Regina, que havia dado voz definitiva à música, também foi lembrada na avenida — um elo poético entre dois ícones gaúchos.

Quem não viu com bons olhos a homenagem foi a Marinha Brasileira. A força armada expressa resistência à ideia de que João seja herói nacional, argumentando que a revolta foi uma afronta à hierarquia e à disciplina militar. João Cândido foi anistiado pelo governo brasileiro em 2008, 39 anos após sua morte.


O desfile da Ilha em 1985 era uma tripla homenagem: ao herói João Cândido, aos compositores João Bosco e Aldir Blanc, e à cantora Elis Regina.

Taí, Elis, taí
Olha o feiticeiro negro
Na Sapucaí
(Didi, Aurinho da Ilha e Aritana – 1985)


Quase 40 anos depois, a Tuiuti resgatou o personagem com mais densidade política. O desfile de 2024 – “Glória ao Almirante Negro” – mergulhou nas contradições da Marinha do Brasil, na luta de João Cândido por dignidade e na sua posterior perseguição. Um desfile potente, crítico, feito para não deixar esquecer.

O projeto que torna insere João Cândido no Livro de Aço dos Heróis e Heroínas da Pátria ainda tramita no Congresso, sob resistência da Marinha. O nome do marinheiro está inscrito no Livro dos Heróis do Estado do Rio de Janeiro.

Ôôô, a casa grande não sustenta temporais
Ôôô, veio dos Pampas pra salvar Minas Gerais
Lerê, lerê, mais um preto lutando pelo irmão
Lerê, lerê, e dizer: Nunca mais escravidão
(Cláudio Russo, Moacyr Luz, Gustavo Clarão, Júlio Alves, Alessandro Falcão, Pier Ubertini e W Correia – 2024)


Alegoria de João Cândido (no desfile da Tuiuti). O velho marinheiro não foi só personagem: virou símbolo de resistência.

Um negro gaúcho que ousou se insurgir contra a violência institucional. E o carnaval carioca entendeu sua grandeza — duas vezes.

João Cândido recebeu outras homenagens no mundo do samba e do Carnaval. Além da Ilha e da Tuiuti, a paulistana Camisa Verde e Branco (2003 e reeditou em 2017), a santista Metropolitana (2010), e em 2017, a Renascer de Jacarepaguá celebrou o encontro fictício do marinheiro com a catadora e poetisa Carolina Maria de Jesus com o enredo “O Papel e o Mar”.



Continua na próxima postagem!
Não perde😉

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